- A Boa Notícia de Paulo -
As ekklesias locais que Paulo fundou procuravam viver num verdadeiro espírito fraterno e de comunhão (aquilo a que chamavam na língua grega de koinonia). Ele desejava que todos se encontrassem num ponto de convergência comum em Cristo: como irmãos amados, testemunhas da ressurreição, e na alegria de viverem como salvos. Porém…
Não eram ainda comunidades modelo. Recém-formadas nas grandes cidades, não podiam deixar de sofrer a influência de um mundo cheio de contrastes e ambiguidades. Nelas conviviam pessoas provenientes de culturas, hábitos e visões religiosas distintas. Aquelas assembleias de Cristãos tinham um longo caminho a percorrer: choques ideológicos entre os judeo-cristãos e cristãos vindos do paganismo, invejas, recaída em práticas pagãs idolátricas ou judaizantes, conflitos... não era fácil formar uma família assim.
Contudo, o Euangelion de Paulo constituía uma força de unidade e vitalidade para estas Igrejas. A sua Boa Notícia era mesmo “excessivamente boa” para ser derrotada pelas dificuldades. O seu zelo incrível, a sua formação rabínica, o contacto com os pagãos, o direito de cidadania romana, o domínio da língua grega, a ousadia e irreverência…tudo isso consagrou-o como uma testemunha excepcional da ressurreição de Jesus! Nem os apóstolos, nem nenhum dos discípulos que tiveram uma vivência histórica com o Nazareno, se atreveriam a sonhar ou a proclamar o que Paulo anunciou…
1 Da Lei à Graça
Perante o seu encontro com o Cristo Nazareno, Paulo chegara à conclusão que a Lei do Sinai não era mais mediação da Benção de Deus. Pelo contrário, aquilo que outrora parecia ser um meio para mudar o coração humano revelava-se na expressão absoluta do que não estava mudado!
O cumprimento das 613 prescrições legais - ou aquilo a que ele chamava “as obras da Lei” – eram resultado da perversão mais absoluta da Torah, e tornavam-se num peso insuportável. Tentar cumpri-las conduzia somente à dureza de coração, à impiedade, e divisão entre os homens. Por isso era impossível que a Lei trouxesse a Salvação. Ela exigia obrigações de tal modo cruéis, que mais depressa levavam à desobediência do que propriamente à sua observância, tornando as pessoas mesquinhas e escravas de minúcias rituais vazias.
Por um lado, os mais duros e impiedosos podiam cumpri-la, e somente eles! Porque só quem caísse em tal espiral de desumanidade convertia-se num “campeão da lei”. Por outro lado, os que não a cumprissem estavam condenados por ela! Para Paulo, este era sem dúvida um beco sem saída para os fariseus e os doutores da lei, dizendo: “os que se apoiam em práticas legais estão sob um regime de maldição” (Gl 3,10).
“Eu não conheci o pecado senão pela Lei. Eu não conheceria a cobiça se a lei não dissesse: Não cobiçarás.” (Rm 7,7); Portanto “onde não existe lei, não há transgressão” (Rm 4,15) e toda “a força do pecado é a lei” (1Cor 15,56)
A grande Boa Nova de Paulo é que tudo isto foi derrotado pela ressurreição de Cristo. Ele viveu toda a sua vida manifestando um amor gratuito e incondicional, amor que vinha de Deus e que agora atingiu a sua plenitude: ninguém tinha de o merecer! Era pura GRAÇA!
A lógica dos méritos pelas “obras da lei” caiu! A Graça manifestada em Jesus de Nazaré é tudo, e mais do que um dogma, era uma experiência viva de Fé das comunidades primitivas. Muitos seguidores do Nazareno, experimentaram a alegria de que já não havia necessidade de esforço humano para receberem uma vida abençoada e salva! Nenhum judeu devia mais empenhar-se por se aproximar de Deus pelo jejum, a meditação, ou as longas orações aprendidas de cor. Nenhum pagão necessitava de fazer mais sacrifícios aos deuses, praticar uma ascese esotérica, ou aprender os “segredos” e “mistérios” duma religião. Ninguém precisava mais de dizer: “eu tenho de fazer…tenho de me esforçar para mudar…eu é que me devo aperfeiçoar…eu...”
Nas comunidades cristãs de Paulo proclamava-se a Boa Notícia de que era o próprio Deus que tomava a iniciativa de transformar o coração humano, de fazer acontecer o Perdão e realizar uma vida nova, mais plena, enriquecida e abundante. Ele mesmo levaria a bom termo o que começou na ressurreição de Jesus. Bastava confiar, abrir-se e acolher com alegria e esperança a força salvadora de Deus que actuava na vida dos crentes pela acção do Espírito Santo, Dom definitivo do Ressuscitado. Os Cristãos agora viviam da Graça: “Tudo nos foi dado, em Cristo Jesus! TUDO!”
E TUDO é muito mais do que poderíamos esperar…
“Quanto à lei, ela interveio para que proliferasse o delito, mas onde abundou o pecado, super-abundou a Graça” (Rm 5,20)
“Portanto, se é por Graça, não se deve às obras, porque senão deixaria de ser Graça” (Rm 11,6)
“O pecado não terá domínio sobre vós, pois não viveis sob a lei, mas sob a Graça” (Rm 6,14)
“Mas Deus é rico em misericórdia; por causa do grande amor com que nos amou, quando estávamos mortos por causa dos nossos delitos, deu-nos a vida com Cristo – é por Graça que vós sois salvos –, com ele nos ressuscitou e nos fez sentar nos céus em Jesus Cristo. Assim, por sua bondade para connosco em Jesus Cristo, ele quis mostrar nos séculos futuros a incomparável riqueza da sua Graça.
Com efeito, é pela Graça que vós sois salvos por meio da Fé; e isso não depende de vós, é dom de Deus. Isto não vem das obras…” (Ef 2,4-9)
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