segunda-feira, 14 de setembro de 2009

AS PARÁBOLAS DE JESUS I - A poesia de um Reino



No Coração de Jesus pairava incessantemente um sonho muito antigo.


Um sonho que emergiu no seio de um povo ao longo de inúmeras gerações de Reis, sacerdotes, profetas, e uma multidão de tantos outros homens e mulheres. Um sonho tão longínquo que remontava até…ao Princípio. Aquele mesmo que falava de um Jardim onde Deus e o homem se enamoravam e em torno do qual gravitava toda a Criação. Um sonho universal, um Projecto, onde Deus mesmo era o Começo e o Fim, o Alfa e o Ómega duma História de Salvação.


Desde há muito que alguns, na esperança do Fim de tanta miséria e injustiça, nomeavam-lhe o “Dia do Juízo” ou “Dia da Ira”; outros porém, na expectativa de um outro Começo, chamavam ao Sonho de “Nova Aliança”…mas todos partilhavam duma esperança comum: Deus é Fiel, e haverá de consumar o Seu Projecto, o Seu sonho…

Jesus, aparte destas designações, chamou-lhe simplesmente Reino de Deus

Não era uma expressão estranha às gentes da Galileia e Judeia. Aquele povo oprimido pelo sufoco de séculos de dominação invasora, e agora dos romanos, aguardava da parte de Deus uma Libertação definitiva e prosperidade para Israel. Todos os sábados e dias de festa recitavam na sinagoga a oração do Kaddish:


«Que o Seu Nome seja louvado e santificado no mundo que Ele criou segundo a sua vontade. Que o Seu Reino irrompa na vossa vida e vossos dias, nos dias de toda a casa de Israel, pronto e sem demora…Que uma paz abundante chegada do Céu assim como a vida venham sem demora sobre nós e sobre todo o Israel…Que aquele que fez a Paz nas alturas a estenda sobre nós e sobre todo o Israel»


Um pouco por toda a parte, e há já algum tempo, a nação ia exibindo sinais de tensão impacientando-se pela inauguração desse Sonho de Deus e do seu Reino Messiânico: Uns formavam grupos de guerrilheiros armados provocando focos de resistência violenta; outros refugiavam-se no deserto em comunidades de monges, preparando-se para serem poupados da Vinda implacável e Terrível que se avizinhava; e outros ainda, ou separavam-se do resto do povo no cumprimento fundamentalista da Lei, ou embriagavam-se com o incenso do Templo na expectativa de se tornarem dignos de aderir aos eleitos do Último dia…


Mas Jesus situava-se noutro horizonte muito mais amplo, porque era exactamente à medida do Coração de Deus! Para ele era muito claro que já estava em emergência um Reino feito de Compaixão, Misericórdia, Perdão incondicional, Justiça e Alegria que inaugurariam um novo tempo, uma nova realidade, com outra lógica e outro modo de ser gente.

Eis as primeiras palavras que Marcos coloca na boca de Jesus:


«Completou-se o tempo. O Reino de Deus está próximo. Convertei-vos e acreditai na Boa Notícia» (Mc 1,15)


A expressão não significa a chegada de um Reino “próximo no futuro”, quase iminente; mas denuncia um ACONTECIMENTO ACTUAL: O Reino chegou AGORA! JÁ!! O tempo da espera e da impaciência esgotou-se! É a hora de despertar daquele Sonho antigo…de abrir o olhar e o coração de Israel para o deslumbramento, e conduzi-lo ao Senhorio inesperado de Deus.


Chegara a hora e a urgência de acordar para permanecer atento à realidade nova que JÁ irrompe no mais íntimo da vida…porque Deus mesmo está a finalizar o seu Sonho, no presente. De alguma forma todos precisavam de ser abalados e despertar da modorra ou desespero em que viviam: tinham de dar o passo, entrar, e tornarem-se cidadãos deste Reino!


Jesus conhecia muito bem o modo de dizer as Boas Notícias ao jeito do seu povo, tão diferente do modo como as dizemos hoje. Nós, ocidentais, falamos das coisas através de conceitos, definições e ideias abstractas. Caímos facilmente na tendência cultural de anunciar o jeito de Deus de um modo dogmático, fechado, conceptual, e filosófico. Por isso, hoje focamo-nos mais no “discurso sobre Deus”, do que no fascínio por Ele…


Ao contrário, o Povo de Israel contava histórias, criava poesia, compunha cânticos, fazia comparações fantásticas e inventava fábulas lindíssimas para permanecer na experiência da Aliança, e abrir o coração à novidade de Deus. Esta fora sempre a única linguagem adequada ao Anúncio da Sua Presença VIVA, Fiel e Salvadora!


E Jesus, como todo o judeu do seu tempo, estava treinado nesta arte de sentir, comunicar e entender o jeito de Deus. Nele estava bem consciente, por exemplo, a forma arrebatada como Oseias narrava o Amor entre Yahvé e Israel, tão ao jeito de um romance ou duma ternura maternal:


«Por isso eis que vou, eu mesmo seduzi-la,
Conduzi-la ao deserto e falar-lhe ao coração.
Dali lhe restituirei as suas vinhas, e o vale de Acor será uma porta de esperança.
Ali ela responderá como nos dias da sua juventude
(…) Eu te desposarei a mim para sempre,
Eu te desposarei na Justiça e no direito,
No Amor e na ternura»
(Os 2,16-21)

«Quando Israel era ainda menino, eu o amei,
e do Egipto chamei o meu filho.
(…) Com laços de amor os atraía, com laços de carinho.
Fui para eles como quem levanta uma criancinha até ao rosto;
Eu me inclinava e lhes dava de comer»
(Os 11,1-4)


E quem não teria presente a comparação belíssima de Ezequiel sobre a Aliança?


«Passei junto de ti e vi-te. Era o teu tempo, tempo de amores,
e estendi a aba da minha capa sobre ti e ocultei a tua nudez;
comprometi-me contigo por juramento e fiz aliança contigo e tu te tornaste minha(…)
Tu te enfeitaste de ouro e prata; os teus vestidos eram de linho, seda e bordados (…)
A tua fama se espalhou entre as nações, por causa da tua beleza que era perfeita,
devido ao esplendor com que te cobrias,…»
(Ez 16,8-14)


Assim, do mesmo modo, Jesus herdara também a destreza do seu povo para criar parábolas, como por exemplo, a de Samuel (2Sam 18, 1-8) dirigida a David, a parábola cantada de Isaías sobre a Vinha (Is 5,1-7), ou as de Ezequiel (Ez 15 e Ez 17)… que dizer ainda sobre as visões de esperança de Jeremias (Jer 32-33), Joel (Jl 3), ou Zacarias (Zc 8-9,12-13)?...


Tantas e tantas eram as imagens vívidas e as experiências simples que reflectiam fielmente a grandeza e o alcance da História da Salvação…


Pois foi assim mesmo, desta forma tão simples, e com este encanto que o Poeta da Compaixão começou a anunciar e contagiar a sua experiência do Reino de Deus…




CONTINUA...

2 comentários:

Sol da manhã disse...

YYYYYYYuuuuuuuppppppppiiiiiiiiii!!!!

Voltaste :D!!!!

Fico à espera que nos contes mais deste sonho que pairava no Coração do Mestre :)!

Obrigada e uma boa semana para ti!

Calmeiro Matias disse...

Obrigado, por este texto com sabor a salvação.
Um abraço
Calmeiro Matias