segunda-feira, 6 de outubro de 2008

NO TEMPO DA SEITA DOS NAZARENOS [5]




- A perseguição -



A rede de fraternidade dos nazarenos estava a dar que falar…


Penetrando nos becos escuros e sujos da cidade santa, levantavam os miseráveis do chão, saciavam os famintos, recolhiam os enfermos e tratavam-nos. Entre eles a solidão convertia-se em alegria, o desespero em confiança, e a necessidade em abundância. Quem se encontrava com a comunidade de Jerusalém dava de caras com uma utopia que emergia na história de Israel; como uma pérola preciosa que brilhava à vista de todos, como uma colheita que produzia frutos a centuplicar, ou como um grande banquete há muito esperado…




E assim os apóstolos e discípulos seguiam fielmente os passos, gestos e atitudes do Mestre de Nazaré, procurando cumprir a profecia:

“ O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me ungiu para dar a boa notícia aos pobres; enviou-me a anunciar a liberdade aos cativos e a visão aos cegos, para pôr em liberdade os oprimidos, para proclamar o ano da graça do Senhor (Is 61,1-2)


Este “ano da graça” proclamado por Isaías correspondia ao ano do Jubileu. Celebrado em cada 50 anos, revelava-se como excepcional em toda a nação. Estava prescrita a libertação dos escravos e a restituição de terras aos pobres que as tinham vendido como dívida a senhores ricos. A palavra de ordem durante esse ano era “abrirás a tua mão ao teu irmão”. Este regulamento da lei judaica constituía uma Graça especial de Deus concedida ao povo. Porém criava precedentes económicos e sociais tão insustentáveis, que na prática não chegava a cumprir-se…


Mas os nazarenos estavam a criar as condições para se realizar o inconcebível. Aqueles “fora-da-lei” estavam realmente a edificar um Reino que constituía uma nova realidade, a demonstrar um Deus de Graça incondicional, a fundar um tempo de Jubileu permanente:


“Não havia indigentes entre eles, pois os que possuíam campos ou casas vendiam-nos, levavam o preço da venda e o depositavam aos pés dos apóstolos. A cada um era repartido segundo sua necessidade” (Act4,35-36)


Entretanto os senhores de Jerusalém entravam em pânico. Não bastava que aquela seita maldita ganhasse a estima de muita gente do povo. Segundo eles, parecia que a identidade da nação estava ameaçada. A Lei não era a prioridade destes nazarenos, e o Templo progressivamente deixava de ganhar relevo na sua comunidade. Receavam assim que deixasse de haver gente a quem cobrar penitências, imolações e dízimos ao Templo. E este constituía o principal centro da economia da cidade…


Perante estes chefes, um desastre parecia iminente e havia que tomar as medidas necessárias para evitá-lo. O que se segue vem-nos relatado no livro dos Actos: cegos pelo zelo mandam agora prender os doze (Act 5,18). Ao retê-los, fazem-no com cuidado para não provocarem a revolta do povo (Act 5,26). O Concelho reúne-se novamente e interrogam-lhes porque tinham violado o seu mandato de não ensinar em nome do Nazareno. A resposta dos apóstolos é incisiva: “vós matastes Jesus, e Deus exaltou-o! E disso somos testemunhas.” (Act5, 30-32)


Perante a teimosia daqueles homens não havia outra solução senão matá-los. Já tinham sido avisados e como reincidentes tinham de ser eliminados. E assim teria sido, não fosse a intervenção de alguém muito importante…



Como membro do Concelho encontrava-se o rabi Gamaliel, “doutor da lei e fariseu respeitado pelo povo”. Era por isso uma figura de peso e manifestava-se como representante duma ala tolerante à seita emergente. Era possível que este rabino, preocupado com a situação do povo, até simpatizasse com os nazarenos. Gamaliel levanta-se e deixa apenas um aviso:

“Agora portanto, aconselho-vos a não vos meterdes com esses homens, mas deixai-os em paz. Pois, se o projecto ou a execução for coisa de homens, há-de fracassar; se é coisa de Deus, não podereis destruí-los, e estareis a lutar contra Deus.” (Act 5,38-39)

A sugestão de Gamaliel não podia ser desprezada pelos restantes membros. O melhor mesmo era soltar os apóstolos por enquanto, e aproveitar uma oportunidade melhor para os liquidar. O Concelho deliberou então açoitá-los, e seguidamente libertou-os. Contudo tinham-se aberto as hostilidades. As autoridades tinham de fazer alguma coisa, e sem demora, antes que fosse demasiado tarde…


2 comentários:

Anónimo disse...

Obrigado, Gustavo:
VÊ-SE QUE SABES IR AO CDERNE DA QUESTÃO.
Obrigado por tomares Jesu e o Evangelho a sério.
Tens a garra dos profetas!
Calmeiro Matias

Anónimo disse...

"Antes que fosse tarde". Sim! E já era tarde... quando a Esperança toma lugar no coração dos pobres, nada os segura porque não têm nada de seu a que se agarrar... Os "grandes" e "poderosos" têm sempre muito medo da força dos "pequenos" quando se apercebem que eles descobriram que "têm peso e ocupam espaço"...como vão poder continuar a a espezinhar os que descobriram que têm em si a "dignidade de filhos de Deus"?