
A comunidade negra de Montgomery, o MIA, e
todos os afro-americanos dos EUA celebravam o fim da segregação racial nos
autocarros, considerada inconstitucional
pelo Supremo Tribunal de Justiça americano. Naquele tempo, apesar das
convicções racistas de muitos políticos, pelo menos estes acatavam e respeitavam
a Constituição.
Nessa altura Martin respirava de alívio, e
começava a ser famoso por ter conduzido um movimento de pessoas a uma revolta
pacífica e ordeira. Estava provado que
as técnicas de não-violência gandhianas surtiam efeito. Mas isso não
impedia que os inimigos dos Direitos Cívicos deixassem de exercer a sua
influência e violência. Bem pelo contrário. Para eles era imperativo iniciar
uma cruzada, recorrendo a todos os meios possíveis, para travar a ascensão do
movimento de King e de outras associações. A sua arma era o uso da força e da
violência, de forma a criar um clima de medo generalizado, para manter a
submissão e impedir o progresso da consciência cívica da nação.
Contudo, foi nesses ataques violentos que
Martin Luther King revelou encarnar a verdadeira força da não-violência. A 30
de Janeiro de 1956, Martin discursava numa Igreja para encorajar o boicote de
Montgomery, até que alguém o avisa sobre a sua casa atacada à bomba. Martin, ao
chegar a casa, encontra-a ainda a arder sob escombros, e uma multidão crescente
de pessoas furiosas, armadas e prontas para descarregarem a sua raiva sobre a
polícia, os bombeiros e sobretudo o presidente da câmara e o chefe da polícia
da cidade.
Depois de se tranquilizar, após saber que a
sua esposa e filhos escaparam ilesos ao atentado, Martin subiu ao alpendre da
sua casa em ruínas e diz: “Está tudo bem!
Aquele que vive da espada perecerá pela espada. O meu desejo é que ameis os
vossos inimigos. Sede bons para eles. Amai-os e mostrai-lhes que os amais”.
(…)
O que estamos a fazer é justo. E Deus está connosco. Ide para vossas casas com
esta fé calorosa e com esta radiosa certeza. Com amor nos vossos corações…”.
De súbito a multidão dispersou. De início,
uma turba perigosa e enfurecida, agora regressava a casa cantando o espiritual
negro “Amazing Grace”. Mais tarde um polícia branco da cidade, e que tinha
estado naquela noite a enfrentar a multidão, comentaria: “se não fosse aquele
pregador preto teríamos todos morrido”.
Noutra ocasião, após o boicote de Montgomery,
Martin fundara oficialmente o seu
movimento: o SCLC (Conferência de Liderança Cristã Sulista). Não se podia perder tempo. Contra alguns dos seus conselheiros mais próximos que apelavam à “prudência”
e “paciência”, Martin afirmava que os afro-americanos já tinham esperado tempo
demais pela sua liberdade e igualdade de oportunidades.
Por isso era preciso aproveitar a
oportunidade dada pelo Supremo Tribunal de Justiça e avançar com novos
protestos à escala nacional. Desta vez, proclamava a “Cruzada pela Cidadania”. Desejava forçar as instituições a cumprir
a lei do pós-guerra que permitia o recenseamento eleitoral de afro-americanos.
Para tal definiu como objetivo duplicar
o número de eleitores afro-americanos do Sul até às eleições de 1960.
Dizia: “Dêem-nos
o voto e nós encheremos as assembleias legislativas com homens de boa vontade.
(…) Dêem-nos o voto e nós, tranquila e não violentamente, sem rancor ou
amargura cumpriremos a decisão do Supremo Tribunal de 17 de Maio de 1954 (…) O
relógio do destino está a esgotar-se. Temos de agir agora, antes que seja
demasiado tarde”.
Rustin, de ideologia comunista estava
proibido pelos conselheiros e membros do SCLC a associar-se publicamente a King,
pois isso podia destruir-lhe a reputação. Contudo, secretamente, Martin e
Rustin partilhavam uma estreita ligação. E assim Martin adquiriu um
conhecimento profundo sobre as estratégias do movimento de Gandhi, e de muitas
táticas de desobediência civil e não-cooperação pacíficas para desarmar os
opressores.
Martin diria mais tarde:
“O
movimento foi desde o início guiado por uma filosofia. Um princípio (…)
designado de muitos modos: resistência não-violenta, não cooperação, resistência
passiva. Foi o Sermão da Montanha, e não qualquer doutrina de resistência
passiva que começou por inspirar os Negros de Montgomery (…).
Porém
com o passar do tempo, a inspiração de Mahatma Gandhi começou a exercer a sua
influência. Para mim, tornou-se claro desde cedo que a doutrina cristã do amor,
posta em prática pelo método da não-violência de Gandhi, era uma das armas mais
poderosas de que o Negro podia dispor na sua luta pela liberdade.(…)
Cristo
dava o espírito e motivação, enquanto Gandhi contribuía com o método.”
Em homenagem a Gandhi, e rendido de admiração
pelo líder indiano, mais tarde em Fevereiro de 1959 Martin Luther King viajaria
à Índia num encontro com o primeiro ministro Nehru. Graças a ele, ganharia novo
fôlego pelo movimento dos Direitos Cívicos.